segunda-feira, 17 de maio de 2010

300 dias entre o céu e o mato

Um dos livros que mais gosto é a narrativa em primeira pessoa de Amyr Klink, 100 dias entre o céu e o mar. Neste livro ele conta como cruzou o oceano Atlântico remando durante 100 dias um bote extremamente equipado e planejado.

Eu tive uma experiência semelhante, passei 300 dias morando em uma casa no meio do mato afastada da civilização e sem carro como meio de locomoção.

Não havia telefone, o celular mal pegava. O único elo com a civilização era uma televisão via satélite. Ficava dias sem falar com outro ser humano.

Nas primeiras semanas tudo foi muito estranho, muito silencio e solidão, uma cartucheira, tão antiga que Borba Gato provavelmente a usou, era minha companhia. Falso conforto, cria da cidade grande desconfia até da sombra. A arma era tão velha, um tiro por vez, eu demorava quase um minuto para rearmá-la. Depois de duas semanas troquei-a por um velho taco de baseball e um cachorro barulhento, muito mais eficiente.

A solidão é algo que assusta, mas a mente humana é impressionante, adapta-se rapidamente. Pensar em voz alta, falar com o cachorro, discutir com a televisão fazia parte do meu dia-a-dia.

Não fui me enfiar no meio do mato a passeio, tinha um objetivo, restaurar e reformar uma casa.

Percebi que sem um planejamento até hoje estaria lixando alguma parte da casa, e ela não estaria pronta. Com isso em mente a experiência solitária de Amyr se tornou meu guia. Instaurei um regime de horário militar, metas semanais a cumprir e parti para a reforma.

Uma das tarefas diárias que mais gostava era fazer um breve diário, como um pilot book marítimo, separei duas passagens que particularmente gosto:

19 de setembro 2005

Mais uma semana vai começar. Fazem mais de oito meses que eu estou nesta balada de monge tibetano. Vivendo e trabalhando sozinho parcialmente longe da civilização. Interessante como a vida dá voltas, nem nas minhas mais loucas idéias poderia visualizar um trabalho como esse.

De estudante de economia, empresário com um casamento fora de controle para um trabalhador braçal vivendo como um eremita com uma paciência oriental para trabalhos solitários. Bela biografia. Vai entender!!!

Muito trabalho pela frente. Começando pelo visual na frente da cozinha: o gramado tem falhas, umidades para resolver e degraus por fazer. Comecei pela pintura do guarda corpo do terraço.

Domingão à noite. Vou assistir o Fantástico. Um pouco de informação não faz mal a ninguém. Entre um bife e outro vejo imagens do trânsito em São Paulo, morro de rir.

17 de novembro de 2005

Afasto-me cem metros da casa. Durante meia hora fiquei sentado, olhado e fumando, percebi que o trabalho estava quase pronto. Todas as madeiras internas e externas da casa foram restauradas. A hidráulica e elétrica funcionando. A casa pintada. Estava na hora de definir um limite para minha obsessão à perfeição.

Lembrei que precisava descongelar o frango para a janta e colocar a lenha para dentro.

Fiz um café.

Estava satisfeito.

Esta foi uma experiência fantástica. Um dia tomo coragem e escrevo um livro.

2 comentários:

ROBSON disse...

continue ,continue parabens seus contos sao muito bons

Rita disse...

Quase um ano sozinho no mato? Tento me clolcar no seu lugar e não me vejo😱