quinta-feira, 9 de abril de 2009

Barbeiro

Fui cortar o cabelo ontem. Finalmente achei um lugar onde me sinto confortável. Foram alguns anos de busca.

Cabelo. Há pessoas que se preocupam muito com essa parte do corpo. Alisam, cortam, tratam, pesquisam a última moda e discutem o resultado. Eu me enquadro em um segundo grupo, daqueles que querem a coisa resolvida.

Tenho saudade do tiozinho que tinha uma barbearia perto de casa. Era montada em uma garagem de automóvel sem placa na porta. Com uma cadeira só antiga forrada de plástico laranja e uma televisão com o sinal ruim pendurada no teto. Sábado de manha, ia a pé de chinelo e bermuda. Não sabia seu nome e ele tampouco o meu. Chamava-me de alemão. Sentava na cadeira que rangia por anos de falta de óleo pegava uma revista. Normalmente era uma Quatro-Rodas ou uma Manchete velha com as últimas fotos do carnaval.

Discutindo o ultimo clássico futebolístico e me embalando em um avental antigo de cor indefinida ele me perguntava secamente: Curto? Eu respondia: Curto!

Com a televisão chiando em menos de quinze minutos ele terminava o corte. Era o tempo suficiente de eu ler uma reportagem inteira sobre o último Rallie dos Sertões.

Aquela rotina tranqüila acontecia uma vez por mês até aquele fatídico sábado.

Era cedo ainda, passei na padaria antes para tomar um café e fui cortar o cabelo. Cheguei e vi a porta abaixada. Um vizinho me informou que ele se aposentara indo morar no interior.

Meio perdido voltei para casa, o problema continuava. Precisava cortar o cabelo. Coloquei uma roupa um pouco mais decente, peguei o carro e saí procurando um barbeiro.

Na placa dizia Soho. Entrei e uma moça cheirosa disse bom dia e me perguntou o que queria. Com uma ponta de mau humor aparecendo tive vontade de dar uma cabeçada à lá Zidane naquela magrela. Como assim? Vim cortar o cabelo. Deu-me uma chave de armário e um mini avental, agradeci mas disse que só queria mesmo era um corte simples. Ela me olhou como se eu fosse de um outro planeta e explicou pacientemente que era para guardar meus objetos pessoais no armário e vestir o avental e aguardar sentado em um sofazinho que já iriam me atender. Dez minutos depois e finalmente consegui entender como colocar o maldito avental, bufando sentei e aguardei escutando uma música indefinida que me faziam sentir que estava em uma sala de espera de um consultório dentário.

Um rapaz magro com o cabelo espetado me conduziu a uma cadeira com um espelho na frente todo iluminado, perguntou se eu queria um chá, disse que só queria algo para ler. Voltou com um monte de revistas sobre moda, dei um sorriso amarelo e perguntei sobre a última Quatro Rodas, ele riu num tom mais amarelo ainda e foi embora.

Enquanto folheava e tentava entender aquela revista um japonês saído do nada começou a massagear meu pescoço. Quase dei um pulo da cadeira. Ele se assustou mais ainda recuando alguns passos. Respirei fundo e falei com a cara injetada de raiva que estava ali para um corte simples, só isso. Afastou-se apressado.

Finalmente um rapaz apareceu com seu séqüito de tesouras. Explico que estou com pressa e preciso de um corte rápido e curto, nada mais. Não quero massagens, chás, revistas ou comentários sobre o último capítulo da novela, só um corte.

Meia hora depois, cabelo cortado de um jeito meio espetado parecendo um porco espinho pago e vou embora.

Voltando para casa passo melancolicamente na frente da barbearia do tiozinho. A porta continua abaixada. Nenhum movimento.

Começo a me sentir como um dinossauro em extinção.


By Marcelo Passerini

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